Adorei Mundo Jurássico. Já adorava antes de o ver. Adoro-o com todos os seus defeitos – sim, a história não tem surpresas, as personagens humanas são pouco mais que carne para canhão (perdão: carne para dinossauro) e mesmo Chris Pratt, Bryce Dallas Howard e Vincent D’Onofrio, todos carismáticos actores, são pouco mais que clichés ambulantes, fazendo o melhor que podem de personagens sem particular faísca.
Mas, na verdade, não quero saber. Malta, eu fui o tipo que gostou de Parque Jurássico III. Sempre com a plena noção de que nenhuma das sequelas se compara ao primeiro – um majestoso combo de história, emoção, efeitos especiais – um daqueles blockbusters que acontece uma vez em vários anos, perfeito de forma e conteúdo, confeccionado pelo homem que inventou os blockbusters perfeitos de forma e conteúdo, Steven Spielberg.
Acontece que, por esta altura, eu não procuro um portento de escrita num thriller sobre dinossauros à solta. Não faço sequer questão que as personagens tenham grande espessura psicológica. Isso procuro noutro sítio. O que eu esperava de Mundo Jurássico era um thriller espectacular com dinossauros à solta – e, com a breca, tive-o em todo o seu esplendor. Se esperava melhor do argumento? Talvez, tendo em conta que Mundo Jurássico foi co-escrito e realizado por Colin Trevorrow, um talento vindo do cinema independente, onde fez uma daquelas jóias que toda a gente devia ver, chamada Safety Not Guaranteed. É verdade que Mundo Jurássico tem alguns detalhes refrescantes de sátira corporativa – dinossauros patrocinados? – e de espírito antimilitarista, mas em entrevistas recentes de Trevorrow, ouvi-o dizer que a sua preocupação era só uma: fazer um “kick ass Jurassic Park movie”. E percebi, pela paixão e conhecimento nas palavras do realizador, que ele estava empenhado em criar um grande espectáculo à medida do espanto juvenil que ele sentira quando, adolescente, foi ao cinema ver Parque Jurássico. A paixão transparece: se é verdade que as partes humanas do filme estão subdesenvolvidas, toda a parte de maravilhamento e thriller com dinossauros (espantosamente bem feitos, num misto de CGI e boa velha animatrónica) é extraordinária, trepidante e muito divertida. Quando o caos arranca, já não pára mais – e os últimos vinte minutos de filme são um monumento de suspense e acção maior-que-a-vida.
E o grande mérito disso é do próprio Trevorrow. Nas críticas que leio, pouco reconhecimento é dado ao que ele consegue aqui. Li alguém dizer que o tom pessoal que ele tinha no seu primeiro filme, o tal Safety Not Guaranteed (que, de novo, insisto para que vejam) é aqui trocado por uma realização impessoal e genérica de filme de acção. Discordo. Para já, o que há mais é filmes de acção mal realizados, tantas vezes confundindo histeria de montagem e de movimentos de câmara com trepidação emocionante (veja-se a escola Michael Bay de realização). Colin Trevorrow que, recordo, vem do pequeno cinema independente, gere o suspense como um mestre e serve-nos a acção com clareza, envolve-nos no cenário, mostra-nos com tempo aquilo que fomos ao cinema ver – dinossauros, alguns de ficarmos boquiabertos – e faz-nos sentir que demos por bem empregue o dinheiro do bilhete. E estamos a falar do bilhete de IMAX: sim, Mundo Jurássico vale, em pleno, os 10 euros. Mais do que um filme, é uma “ride”, uma montanha russa empolgante e bem imaginada – e ninguém deve ficar frustrado por não encontrar espessura psicológica numa montanha russa.
Mundo Jurássico pede que entremos na sala e deixemos cá fora parte da nossa idade. Apreciá-lo e passar duas horas empolgantes e divertidas implica abraçarmos a possibilidade de voltarmos a ter uns 12 anos quando nos sentamos na cadeira no cinema e pomos na cara os óculos IMAX. Não há nada de errado nisso.
Com algum alívio, soube que o realizador Colin Trevorrow recusou amavelmente dirigir a próxima sequela. Fico feliz, porque – como o prova Safety Not Guaranteed (a sério, vejam este filme!) – ele tem muitas ideias novas e originais que não se coadunam com a grande indústria e quer pô-las em prática. Apesar de ter gostado muito do que ele fez em Mundo Jurássico, espero ver mais criações pessoais dele (ainda lamento que Mark Webb, que realizou os dois últimos Homem-Aranha, nunca mais tenha tido tempo para fazer um filme com a simplicidade e a imaginação da sua pequena comédia não-romântica, 500 Days of Summer, parecendo ter sido engolido por Hollywood). Que venha outro volume Jurássico e que seja tão divertido como este.